quarta-feira, julho 09, 2008

Os genes da fé

A crença na vida eterna como elemento de evolução e preservação da espécie

Do ponto de vista científico, aquilo que se busca nas inúmeras crenças humanas e religiões está bem determinado. Para colocar de uma forma bem simples: somos eternos! Cada pedacinho de nós se preservará para sempre, obedecendo a uma lei natural que determina que a matéria (massa+energia) não pode ser criada nem destruída. Quando morremos, viramos novamente pó das estrelas, de onde viemos e para onde vamos.

Esta visão científica, no entanto, não satisfaz a grande maioria das pessoas, que busca conforto espiritual em sua fé, normalmente associada à perspectiva de uma 'vida' após a morte. Sempre fui intrigado com esta questão da fé pela fé, e até hoje não consegui entender por que as pessoas parecem necessitar e são levadas a acreditar que o ser humano pode ser imortalizado como tal, mesmo vendo seus corpos desaparecem em fumaça e pó.

Não seria mais fácil aceitarmos que somos eternos, como a boa ciência nos ensina? Certamente que não! Pode-se argumentar que a maioria das pessoas não possui um vasto conhecimento científico para entender e aceitar esta realidade, mas essa premissa não é consistente. Mesmo cientistas de renome respondem ao apelo da fé e tentam justificar sua crença com base em preceitos 'científicos'.

Então por que é que somos praticamente forçados a acreditar em Deus e vida depois da morte? Em minha opinião só há uma explicação: a crença na vida eterna é um elemento natural, próprio do arcabouço biológico que trouxe o ser humano até o seu atual estágio de evolução. Vamos tentar provar isto por contradição, ou seja, mostrando que se ele não acreditasse, não estaria aqui para ler ou escrever este artigo.

Fé é um atributo humano! Cachorros não têm fé, formigas não tem fé, bactérias não têm fé. Chimpanzés também não, até onde sabemos.

A fé, ou seja, a crença em uma dada coisa sem que se precise provar a sua existência no plano físico, é um sub-produto elaborado e conseqüência da consciência.

Vamos a analisar a situação hipotética de que os seres humanos desaparecessem do planeta, por uma causa qualquer, que extinguisse a espécie, como ocorreu, por exemplo, com os dinossauros. Tudo indica que a próxima espécie a alcançar o estado de consciência, da forma como a conhecemos, seria o chimpanzé. Vamos imaginar um cenário onde alguns chimps tomassem consciência da própria existência e de sua natureza, num processo semelhante ao que deve ter ocorrido com o ser humano. Muito certamente esta tomada de consciência tem relação com um nível de linguagem e comunicação mais avançado. A linguagem é o elemento básico que permite a elaboração de pensamentos concretos e abstração de idéias. É inevitável o choque entre a auto-consciência e o Universo esplêndido ao redor! Como entender a limitação da mente e do corpo num cenário tão espetacular: o Sol, a Lua, as estrelas, os trovões, os relâmpagos; o dia, a noite; a vida, a morte...? Os chimps olhariam para o céu e adorariam o seu deus ou os seus deuses. A sensação de vazio e impotência diante da força da Natureza não permite à mente consciente a exposição à sua própria fragilidade. A única forma de preservar a mente e consciência é acreditar que uma força superior, visível ou invisível, vai mantê-la no estado de permanente lucidez. Se essa crença não existir, a mente é forçada a atribuir-se a si a fragilidade nua e crua da vida, ou seja, a sua morte. Neste contexto não sobra espaço para a construção de uma sociedade moral e eticamente comprometida. O resultado é um 'bando de animais' que vai –pelo seu poder de manipulação dos objetos naturais– destruir-se a si próprio. Os bárbaros que os digam. É o respeito pelo Sagrado, pelo Superior, pelo Onipotente, quem transforma o animal em um ser socialmente capaz, eticamente defensor da própria espécie, e religioso.

Os genes que nos preservaram e nos colocaram no planeta como espécie dominante são genes comprometidos com a fé! De alguma forma que a ciência ainda vai precisar explicar, existem processos bioquímicos que não nos dão outra alternativa senão crer em algo superior, seja ele Deus ou a própria Ciência. Para os que não acreditam em nada haverá sempre o Sol, as estrelas, o Universo.